
A Jurema Sagrada foi oficialmente reconhecida como patrimônio imaterial da Paraíba em uma cerimônia realizada na quarta-feira (16), uma conquista celebrada por praticantes e estudiosos da religião. Eriberto de Carvalho Ribeiro, conhecido como Pai Beto de Xangô e presidente da Federação de Umbanda, Candomblé e Jurema (FCPumcanju) de João Pessoa, destacou a importância dessa conquista, lembrando dos ancestrais que enfrentaram a intolerância religiosa e enfatizando a necessidade de continuar a luta contra o preconceito.
“Nossos antepassados devem estar em profunda alegria, pois, mesmo no século XXI, as pessoas ainda são julgadas por suas crenças, cor, raça e orientação sexual. Viver momentos de reconhecimento da nossa religião como patrimônio imaterial é extremamente gratificante,” afirmou Pai Beto.
A iniciativa, proposta pela deputada estadual Cida Ramos (PT), visa valorizar uma das expressões religiosas mais tradicionais do Nordeste. A parlamentar explicou que o objetivo é promover o respeito e a preservação da Jurema Sagrada, que é especialmente significativa nas comunidades de Alhandra e Conde, na Grande João Pessoa.
Para desenvolver o projeto de lei, Cida Ramos se reuniu com representantes da Federação de Umbanda, Candomblé e Jurema em 21 de janeiro. Pai Beto, que participou da reunião, considerou a aprovação da lei como um marco histórico para os praticantes das religiões afro-indígenas no estado, especialmente para a Jurema, que frequentemente enfrenta incompreensão e discriminação.
A cidade de Alhandra é reconhecida como o berço da Jurema Sagrada no Nordeste.
História da Jurema Sagrada na Paraíba
O uso ritualístico da jurema na Paraíba remonta ao século XVIII, conforme relata o pesquisador Estevão Palitot. Na época, a região era habitada pelos indígenas Canindé e Xucurú, que enfrentaram repressão ao serem denunciados ao governador de Pernambuco, então capitania da Paraíba.
“Os padres carmelitas, responsáveis pelo aldeamento, ficaram alarmados com o culto da jurema, que reafirmava os vínculos espirituais dos indígenas com suas tradições ancestrais. Isso gerou uma forte reação, culminando em uma denúncia ao Bispo de Pernambuco,” explica Palitot.
Após a denúncia, tropas foram enviadas ao aldeamento, resultando em violência contra os indígenas, que temiam abandonar o local sob domínio colonial.
Apesar da repressão, a prática da Jurema continuou a ser mantida entre diversos grupos indígenas na Paraíba, como os Corema, Panati, Ariú e Pega. Com o tempo, o culto incorporou elementos de tradições afro-brasileiras e do sincretismo católico, sendo às vezes referido como “Catimbó”.
“A Jurema, ao ser registrada historicamente, já traz a marca dos povos indígenas e a luta contra o colonialismo, além do diálogo com os povos negros. Isso demonstra a resistência indígena e a reconstrução do catolicismo por meio dessa resistência,” comenta o antropólogo Estevão Palitot.
Ele ressalta a relevância do reconhecimento da Jurema Sagrada como patrimônio imaterial da Paraíba, após séculos de perseguições: “A Jurema passou por séculos de repressão, discriminação e ameaças, e hoje é reconhecida como um símbolo cultural e de identidade paraibana, além de representar a resistência dos povos afro-ameríndios na região.”